Vemos isso no fato de a presença do repórter se mostrar mais importante do que a própria notícia em si. Quando se inicia um conflito no Oriente médio, o repórter precisa viajar milhares de quilômetros até o local do confronto e, vestindo uma roupa protetora, dizer que uma bomba pode cair a qualquer momento em sua cabeça. Ao mostrar as famílias que sofreram perdas, o mais importante é a sensibilidade do repórter capturada pelas câmeras, em um exercício metalinguístico: o jornal que fala do seu repórter.
Ideias como a do físico Heisenberg nos afirma ser impossível observar um objeto sem interferir em tal. Noticiaristas deveriam dobrar o cuidado já que além de observar, eles têm de descrevê-lo. Não obstante dois sentidos tão naturais ao ser humano, visão e fala, jornalistas ainda querem se utilizar de um suposto sexto-sentido. Essa capa de super-jornalista é adquirida ainda nos estudos nas faculdades, as quais oferecem seus cursos com o marketing apontando seus futuros formandos como agentes de transformação social.
Mas ainda parece ser outra a necessidade a ser suprida: depois do estresse do dia, faz-se preciso excretar os resíduos psíquicos para uma renovação para o dia seguinte. Em contraste com as complexas explicações históricas para conflitos no Oriente Médio, parece que é nos acontecimentos mais corriqueiros da vida do cidadão comum que a mídia estará buscando o ápice da sua produção, de tal forma que a levará à exaustão. Paralelamente às super-câmeras que capitam o pingo do suor caindo do rosto cansado do jogador de futebol, vão ser as câmeras de segurança domésticas, as de celulares e até mesmo as de canetas espiãs de qualidade péssima que cumprirão o papel de remontar a realidade tal como ela é nas ruas em um show de sensacionalismo dramático.
Na volta do trabalho para a sua casa, o indivíduo precisa fechar o ciclo de sua rotina ao se projetar para o restante do mundo, visto através das lentes das câmeras. É dessa maneira que o suspeito de assassinado, diante do microfone do repórter, se tornará o elemento sacrificial, como no mecanismo do bode expiatório teorizado por René Girard [1], para restabelecer a ordem à sociedade.
Precisamos acabar com essa sensação dos noticiários serem parte indispensável da vida do cidadão. Primeiramente no âmbito individual, em seguida levantando discussões sobre a relevância do noticiado. A televisão precisa deixar de ser o banheiro do nosso psicológico.
Notas:
[1] O bode expiatório em René Girard: documento.
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